Estivemos há alguns dias na casa de um Professor aposentado. Pescador antigo, de poucas mentiras e daquele tempo em que havia rios para pescar. Com os seus afazeres diários, para ocupar o tempo que, às vezes ,teima em oferecer dificuldade em passar. Lá estava ele agarrado em sua plaina de mão, a esboçar uma peça que estava na sua cabeça e a mão obediente seguia a perícia do projeto.
Foi inevitável. Nós já o havíamos interrompido. Mas com isso ele nem se incomodou, apenas virou-se para nós e sorriu.
- Olá, gente boa, chega pra cá. O outro cachorro está preso!
Entramos e fomos logo dar uma espiada em uma das suas raridades - um pé de coitê, que tem no fundo do seu quintal, de onde retiramos seus frutos secos, para fazer artezanato com suas cabaças. Ao chegar à beira do muro, para ver o nosso tesouro, que surpresa! Do outro lado, talvez fora da vista do vizinho, por estar escondido entre o pé de jaboticaba e as folhas de uma mangueira, lá estava o velho pé de laranja natal, todo viçoso, com giagantes frutas ja acizentadas de tão maduras, eram mais de três dúzias, imaginamos nós. Viramos para o Professor e indagamos:
- O que é isso, amigo?
- Um pé de laranja madura!
- Mas?!
Ficou um tempo quieto, a olhar para nós e para o pé de laranja. Quando o seu olhar cansado, se detalhou em nós, como uma etiqueta de um filme que a vida lhe guardava na alma, balançou a sua cabeça afirmativamente. Naquele instante deve ter passado em nossas mentes a mesma resposta. Ele apenas continuou a nos olhar e nada falou.
Voltamos para a sua bancada, onde ele voltou ao trabalho, empunhando uma lima e um formão e nem se amolou com o incômodo da nossa visita. Enquanto nós o observávamos lembranças passaram pela nossa cabeça. Lembramos dos nossos pais que, quando chegávamos em casa com alguma coisa diferente, nos perguntava onde a tínhamos achado e nos mandava colocar de volta, porque ela não nos pertencia.
Ali na nossa frente estava alguém que não lançava mão daquilo que não era seu. Alguém que ainda cultivava o grande princípio da convivência harmoniosa e pacífica do compreender e respeitar o que é o outro e o que é do outro.
Afinal, pensamos, excelente pessoa para tomar conta do mundo. Fomos embora pensando naquele pé de laranja que não estava bichada, nem tinha marimbondo no pé. Mas que continuava lá a espera da colheita do seu dono.
Já no portão, indagamos:
- Professor, e a política?
- Deixa isso para lá, está cada vez pior, melhor ficar de fora dessa sujeira!
4 comentários:
Félix, não conhecia esse seu lado lúdico. Aquele andarilho da moto falou que deveríamos endurecer, sem nunca perder a ternura, mas cabra, tu não achas que está com muita ternura, não? Abraços, Djahojinho.
Meu grande palestrante Djahojinho, tu que és oriundo da baixada da égua, sabes muito bem que os brutos também amam.
tá rolando um clima...hehehe
belo texto felix...
Foi-se a época onde os valores estavam impressos em nosso DNA, hoje, os valores tem que estar assinalados em sentenças judiciais..
Achei, Félix
Um abraço
coloquei um link do meu Blog para o seu.
Bem-vindo e obrigado pela força.
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